sexta-feira, 1 de abril de 2016

O LIVRO PRIMEIRO DE ATAS DAS SESSÕES DA CÂMARA




SÉRIE  “PONTE NOVA: 150 ANOS” –   Nº 4




O ARQUIVO PÚBLICO MUNICIPAL DE PONTE NOVA:
GUARDIÃO DA MEMÓRIA






No dia 26 de abril próximo, ele completará 153 anos. Certamente é mais antigo que isto, pois suas folhas tiveram de ser confeccionadas, pautadas, numeradas e encadernadas em formato de livro com capa de couro. Naquela época, já se produzia este tipo de artigo aqui no Brasil, mas, em tempos anteriores, teria de ser adquirido da Europa, pois, na época colonial, não produzíamos artigos dessa natureza. A indústria gráfica só chegou ao Brasil em 1808, junto com a Família Real. Já a produção de papel só começou em 1809. Assim, podemos afirmar que nosso ilustre aniversariante é brasileiro, produzido integralmente no Brasil.
A qualidade de suas folhas não é boa. Trata-se de papel produzido à base de pasta de celulose, nova técnica usada pela indústria da época para acelerar o processo de fabricação do papel, diferente dos papéis do século XVIII, que eram produzidos a partir de tecido velho, por isso era chamado “papel de trapo”, um papel sem acidez, composto de fibras longas de algodão, o que lhe conferia resistência e durabilidade. Já os papéis fabricados a partir da pasta de celulose, naquela época, eram de baixa qualidade pelo excesso de acidez e pelas fibras curtas, portanto, de pouca durabilidade. E é o que se percebe no primeiro livro da Câmara. Com seus 153 anos de uso, suas folhas já estão acidificadas e quebradiças, portanto precisam ser protegidas para que sobrevivam pelos próximos 153 anos.
Talvez ele seja um dos poucos, ou mesmo, o único testemunho ainda vivo daquele glorioso dia, o dia em que o povoado de Ponte Nova conquistou sua autonomia política e administrativa.
Foi este um fato de grande importância para os moradores de toda a região, pois, com isso, muitas de suas demandas poderiam ser encaminhadas e resolvidas aqui mesmo, sem ter que recorrer à cidade de Mariana, da qual a freguesia de Ponte Nova fazia parte.
 Era meio dia quando teve início a Sessão da Câmara para instalação da nova vila e município e dar posse aos vereadores eleitos. A casa para seu funcionamento foi doada por Antônio Ildefonso Martins da Silva, sendo concluída e mobiliada pelos próprios moradores de Ponte Nova. É interessante ver que a casa da Câmara servia também de Cadeia e Tribunal do Júri.
Como presidente da nova Câmara, assumiu o vereador mais votado, capitão Manoel Francisco de Souza e Silva, juntamente com os demais vereadores eleitos: major Miguel Martins Chaves, capitão Antônio Justiniano Gonçalves Fontes, capitão Joaquim Rodrigues Milagres, capitão Luís José Pinto Coelho da Cunha, capitão Antônio Carlos Correa Mayrink e Sebastião José do Monte.
Terminada a sessão de posse, o presidente determinou que todos os atos e documentos fossem arquivados para serem conservados. Podemos ousar dizer que o Arquivo Público Municipal de Ponte Nova nascia naquele momento. Isto, porque é consenso entre os arquivistas e a própria legislação em vigor que arquivo é um conjunto de documentos produzidos e recebidos por uma instituição ou pessoa no exercício de suas funções, e não apenas uma instituição que conserva documentos.

José Geraldo Begname
Esp. Historiador/Restaurador

Chefe do Arquivo Público Municipal de Ponte Nova

ORIGEM DO ACERVO DOCUMENTAL DO MUNICÍPIO DE PONTE NOVA


SÉRIE  “PONTE NOVA: 150 ANOS” - No 3



O ARQUIVO PÚBLICO MUNICIPAL DE PONTE NOVA:

GUARDIÃO DA MEMÓRIA



Como contar a história administrativa, social, cultural, política e econômica de Ponte Nova? Esta história, em parte, só pode ser contada através dos documentos públicos que se encontram guardados no Arquivo Público Municipal de Ponte Nova. Patrimônio cultural e científico pertencente a todos, ele deve, por isso, ser preservado.
O Arquivo Público Municipal de Ponte Nova divulgou recentemente mapa mostrando a área ocupada pelo Município entre os anos de 1863 e 1876. Por ele, temos uma ideia da extensão do seu território e da sua população naquela época.
Com a criação do Município de Ponte Nova e da instalação de sua Câmara Municipal em 1863, coincidia com este fato a instalação do Termo Judiciário e do Cartório do Primeiro Ofício de Notas, ou seja, a região ganhou autonomia administrativa e judiciária. Seus cidadãos não precisariam mais ir a Mariana para registrarem documentos, terras, propor ações na Justiça, solicitar melhorias urbanas etc. É a partir deste momento que começa a ser constituído o valioso acervo documental público do Município, que naquela época se estendia até Manhuaçu e Caratinga.
Antes de mais nada, não podemos, entretanto, perder de vista que a primeira instituição local foi a Igreja, cuja Paróquia foi instalada em 1833. Assim, o acervo documental mais antigo existente no Município está na Casa Paroquial da Matriz São Sebastião. Embora seja um acervo privado, é considerado pela própria Igreja como de interesse público, por seu valor social, cultural e científico.
Em nível local, a Câmara era a instituição máxima do poder temporal. Era responsável pelas questões administrativas, como, por exemplo, controlar a ocupação e o uso dos espaços públicos, controle do comércio, desenvolvimento da educação, manutenção dos espaços públicos, serviço de abastecimento de água e esgoto etc. Assim, a Câmara cuidava das questões legislativas e administrativas municipais. 
Outra instituição que nasceu juntamente com a Câmara foi o Poder Judiciário, com o Tribunal do Júri e o Cartório do 1o Ofício de Notas. Com o desenvolvimento da região, em 1883, a cidade passa a ser sede de Comarca. Desta forma, consolidava-se uma nova instituição pública na cidade: o Fórum.
Em 1930, o Poder Executivo se desvincula da Câmara Municipal, passando a ter representante próprio: o prefeito municipal. Nascia assim a Prefeitura como instituição independente da Câmara. É bom lembrar, que até 1930, o presidente da Câmara concentrava em suas mãos as funções de chefe do Legislativo e do Executivo.
No cumprimento de suas funções, estas três instituições públicas (Câmara, Fórum e Prefeitura) geraram e ainda geram enorme massa documental.
Esses documentos, que naquela época nasceram com funções políticas, jurídicas e administrativas, por serem antigos, datados dos séculos XIX e XX, hoje, além de continuarem servindo como prova de direitos e obrigações, ganharam outro valor: o cultural e o científico. Isso significa que a cidade possui um patrimônio cultural que é único, depositado no seu Arquivo Público Municipal. Também não podemos esquecer que este patrimônio diz respeito não só a Ponte Nova, mas a toda uma região, que hoje é formada por 26 municípios, com população de 431.224 habitantes.
O interesse pela preservação deste acervo documental surgiu na década de 1940, ao longo da Administração do Prefeito Otávio Soares. Seu secretário de Administração, o professor Mário Clímaco, liderou o trabalho de catalogação dos documentos da Câmara. Trabalho que ainda está preservado da forma como foi feito. Este fato nos revela a ligação de Ponte Nova e alguns de seus intelectuais aos movimentos nacionais. Isto porque em 1937 o Governo Federal criou o SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), com a finalidade de proteger o patrimônio histórico e artístico do país. É neste contexto que foram iniciados os trabalhos de organização do acervo documental do período colonial das cidades de Mariana e Ouro Preto. Desta forma, Ponte Nova se alinhava à política nacional de preservação do patrimônio cultural ao cuidar da preservação de seus documentos públicos.
Em 1971, importante trabalho de arrolamento das fontes documentais históricas de Ponte Nova foi feito pela professora Olívia Marina de Avellar Senna, para ser apresentado no VI Simpósio Nacional de Professores Universitários de História, realizado naquele ano, em Goiás. Nesse trabalho, ela identifica 14 “Arquivos”, ou fundos documentais diferentes, a saber: Arquivo da Câmara Municipal (1863), Arquivo da Prefeitura Municipal (1930), Arquivo da Paróquia São Sebastião (1833), Arquivo da Paróquia da Santíssima Trindade/bairro Triângulo (1966), Arquivo da Paróquia São Pedro/bairro Palmeiras (1926), Arquivo do Cartório de Registro Civil (1889), Arquivo do Cartório do 1o Ofício (1863), Arquivo do Cartório do 2o Ofício (1863), Arquivo do Cartório do 3o Ofício (1926), Arquivo do Cartório de Registro de Imóveis (1874), Arquivo do Cartório Distribuidor, Contador, Partidor e Avaliador Judicial (1882), Arquivo do Cartório de Títulos, Documentos e Protestos (1923), Arquivo do Cartório Privativo do Crime (1863) e, por fim, um conjunto de jornais editados no Município (1886). Seu trabalho consistiu numa listagem informando os tipos documentais existentes nesses arquivos e suas datas-limite. Este foi, sem dúvida, o mais importante levantamento dos documentos existentes nos arquivos da cidade em épocas passadas.
Em 1993, outro trabalho importante na história da formação do Arquivo Público Municipal de Ponte Nova foi desenvolvido pelo professor Ângelo Alves Carrara, do Departamento de História da Universidade Federal de Ouro Preto. Diferentemente do trabalho desenvolvido pela professora Olívia, este teve como ação principal a organização e o acondicionamento da massa documental acumulada, que se encontrava desordenada. Participou ativamente deste trabalho Isabel Martins de Oliveira Penna, na época, funcionária da Prefeitura e responsável pelo Arquivo.
A fim de garantir que este trabalho não se perdesse e que os novos documentos produzidos pelos órgãos públicos passassem a ser acumulados de maneira ordenada, foi aprovada pela Câmara a Lei 1.908, de 21 de dezembro de 1993, que instituiu o Sistema de Arquivos do Município de Ponte Nova. Claramente uma ação que visava, já naquela época, proporcionar ao Município uma organização sistêmica e continuada de seus arquivos, assim como a sua preservação obrigatória.
 Embora a proposta do professor Carrara fosse notável, novamente a gestão dos arquivos e a própria Lei Municipal no 1.908 caíram no esquecimento das administrações vindouras. O resultado do descaso não poderia ser diferente, e a documentação continuou sendo acumulada de maneira desordenada, com a falta de investimentos expondo os documentos aos riscos de perdas e danos em razão do descuido.
Felizmente a documentação sobreviveu e, no período de dezembro de 2006 a dezembro de 2008, foi desenvolvido novo projeto, com apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), orientado pelo mesmo professor Carrara e coordenado pela historiadora mestra Alexandra Maria Pereira. Toda a documentação relativa ao período de 1863 a 1945 foi higienizada e inventariada. O inventário gerado possibilitou o tombamento provisório desta documentação em 2014 pelo Decreto Municipal no 9.728. Em 2007, foi incorporado ao acervo do Arquivo o Fundo Documental do Cartório do Primeiro Ofício de Notas (1863-1945).
Entre 2015 e o início deste ano (2016), novas ações buscaram modernizar os serviços do Arquivo Público Municipal. Entre elas, está a aprovação da Lei Municipal no 3.968/2015 estabelecendo a adequação das competências do Arquivo Público Municipal à legislação vigente. Foram adquiridos equipamentos para montagem de laboratório de conservação de documentos (freezer e mesa de higienização), bem como mobiliário para melhor conservação dos documentos. Na parte física do Arquivo Público Municipal, está em andamento ampla reforma: troca do telhado, colocação de isolamento térmico e forro, troca das instalações elétricas, pintura e remoção das estantes de madeira. A soma destes investimentos supera R$ 43.000,00, sendo a maior parte executada com recurso próprio e com recurso do Fundo Municipal de Cultura, investimento aprovado pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural e Natural de Ponte Nova.

José Geraldo Begname
Esp. Historiador/Restaurador

Chefe do Arquivo Público Municipal de Ponte Nova

PARA QUE SERVE UM ARQUIVO?


SÉRIE  “PONTE NOVA: 150 ANOS” - No 1



O ARQUIVO PÚBLICO MUNICIPAL DE PONTE NOVA:
                     GUARDIÃO DA MEMÓRIA



Não podemos conhecer a história de Ponte Nova apenas caminhando por suas ruas mais antigas ou lendo livros que contam sua história. É preciso “caminhar” também por seus documentos, guardados pelo Arquivo Público Municipal de Ponte Nova.
Há pessoas que acreditam que arquivo é um lugar sem vida, abandonado, depósito de caixas com papéis velhos e inúteis, daí a expressão “arquivo morto”. No outro extremo, estão aqueles que acreditam que é um local para pessoas eruditas, pesquisadores, cientistas. Não! Arquivo deve ser um local de acesso para qualquer cidadão sobretudo ao conteúdo de seu acervo.  Não existem cidadania, democracia, liberdade sem acesso à informação, ao conhecimento, parte deles depositada em nossos arquivos.
Desta forma, o arquivo é um tipo de instituição que guarda a memória da sociedade que o gerou. Os documentos são importantes porque são fontes de informação sobre a cultura, as relações sociais e econômicas, entre tantas outras possibilidades de pesquisa, tantas quantas nossa criatividade permitir. Os documentos, por tratarem de fatos e atos específicos de uma sociedade, pessoa, época, são únicos. Cada documento constitui uma unidade particular, mesmo que serial, diferentemente dos livros de bibliotecas, que são editados em maior quantidade de unidades. Quando deixamos um arquivo se perder, deteriorar, queimar, tomar chuva, jamais será substituído por completo, mesmo havendo cópias de segurança, simplesmente por serem cópias. Por exemplo, se o primeiro livro de atas da Câmara se perder, não encontraremos outro em lugar algum, é um livro único.
Uma política de preservação da cultura de um povo e de seu patrimônio cultural não terá êxito, se deixar de lado os arquivos. Um patrimônio edificado não enseja em si valor apenas estético, mas dele nos interessa saber também quem o construiu, a técnica utilizada, os materiais, o valor financeiro, o tempo de execução, o seu significado para a comunidade etc. Muitas dessas informações terão de ser buscadas nos arquivos.
Não existe arquivo morto. Um arquivo morre quando nós o matamos, por vontade ou omissão. Assim disse um estudioso da arquivologia em 1913: “O grau de civilidade de um povo se mede pela forma como cuida de seus arquivos.” Disse isso, não por acreditar que é nobre cuidar das coisas antigas, por serem simplesmente antigas ou belas, mas por possuírem valor informativo de relevância para a cultura e a ciência. Ele não está preocupado em preservar o que ficou do passado como se fossem relíquias, exemplares de um tempo que não voltará. Não! Ele está preocupado também com o futuro!
Os arquivos constituem um tipo de lugar tão importante quanto os museus. Preservá-los é necessário, se queremos construir uma sociedade livre e democrática. Não há como edificar a liberdade e a democracia sem que todos tenham acesso à informação e ao conhecimento. Este preceito é tão importante, que está definido na Constituição Brasileira, em seu art. 5o, incisos XIV e XXXIII, que tratam do acesso a informação e aos documentos públicos. Não há garantias de que os cidadãos tenham acesso à informação, se os documentos não forem preservados ou estiverem inacessíveis. Cabe aos Municípios a preservação da documentação pública municipal: é o que diz o parágrafo 2o do art. 216 da Constituição Federal.
Uma pesquisa recente, feita pelo Conselho Nacional de Arquivos, concluiu, entretanto, que apenas um por cento dos Municípios brasileiros possui arquivos. Por que o número é tão baixo? Por duas razões maiores. A primeira é de ordem política. Não há política pública nos Municípios para preservação de arquivos. A maior parte dos investimentos que existem é feita com recursos do Estado ou da União, através das políticas de incentivo à cultura. A segunda é de ordem técnica.
O Conselho Nacional de Arquivos considera arquivo somente aquelas instituições que desempenham suas funções tanto de custódia, como de preservação, de difusão de seus acervos e de gestão documental, como definido na Lei Federal de Arquivos (8.159/1991). Não significa que apenas um por cento dos Municípios possui documentação preservada. Significa que muitos Municípios não têm nenhum tipo de política ou ação de preservação de seus documentos. Um arquivo vivo, moderno desenvolve seu trabalho ao longo das três idades dos documentos: a corrente, a intermediária e a permanente. 

José Geraldo Begname
Esp. Historiador/Restaurador

Chefe do Arquivo Público Municipal de Ponte Nova